Capítulo 1 Introdução

O Observatório da Insolvência é um projeto contínuo, iniciado em 2017 pela Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ) em parceria com o Núcleo de Estudos de Processos de Insolvência (NEPI) da PUC-SP. O objetivo do observatório é colher dados estatísticos dos processos judiciais envolvendo empresas em crise, buscando identificar gargalos e oportunidades para aprimorar a prestação jurisdicional.

A insolvência jurídica é pressuposto da decretação da falência. Ela é decorrente da presença da impontualidade injustificada (art. 94, I), da execução frustrada (art. 94, II), da prática de atos falimentares (art. 94, III) ou do requerimento de autofalência. Sua presença não se confunde com a necessária insolvabilidade econômica do devedor, situação em que seus ativos não são suficientes para suportar a satisfação de todas as suas obrigações.

A falência, nesse contexto, apresenta-se como a situação final do empresário em crise. O empresário, sem condições de continuar a conduzir de forma eficiente sua atividade empresarial, tem a liquidação forçada do conjunto de bens para que seu produto seja rateado para a satisfação dos credores, conforme a ordem legal.

A legislação que regula empresas nessas condições é a Lei 11.101/2005. O instrumento de falência é utilizado com a finalidade de causar o menor prejuízo possível aos credores. O pedido tem como princípio a satisfação de todos os credores, de modo que cada um receba de forma proporcional a parte restante do patrimônio da falida, conforme ordem legal de pagamento.

Há três formas de iniciar um processo de falência. O mais comum é o pedido de falência requerido pelo próprio credor que não teve suas dívidas satisfeitas. Outra forma de iniciar a falência é através da autofalência, que ocorre pelo pedido voluntário de falência da empresa, ou em decorrência de processos de liquidação extrajudicial.1 A terceira forma é a convolação da recuperação judicial em falência, que ocorre quando a tentativa de recuperar a empresa judicialmente é infrutífera.

O processo de falência é dividido em 3 fases: inicial, sindicância e liquidação.

  1. Fase inicial ou declaratória: comprova a impossibilidade de continuar o negócio.

  2. Sindicância: apura os motivos da falência e analisa os ativos e passivos do negócio.

  3. Liquidação: os ativos são vendidos e, com o montante arrecadado, as dívidas são pagas.

Assim como na recuperação judicial, a falência também conta com a figura do Administrador Judicial (AJ). O AJ tem o papel de administrar o processo do ponto de vista da falida, auxiliando nos contatos com os credores, identificação e venda dos bens, e contribuindo em eventuais investigações de crimes falimentares.

Um processo de falência pode levar muitos anos para ser encerrado. Isso ocorre por conta das dificuldades em listar os bens disponíveis para venda (arrecadação), para avaliar e vender os bens. A percepção geral é que o processo de falência é pouco efetivo, já que demora muito e recupera uma parcela irrisória das dívidas.

1.1 Objetivo e questões norteadoras

O objetivo principal da pesquisa é obter uma visão empírica do processo de falência. Especificamente, o estudo busca solucionar os pontos listados abaixo.

  • Obter estimativas do tempo de duração de cada fase dos processos.
  • Caracterizar as empresas envolvidas.
  • Comparar os valores de avaliação de bens e vendas através dos leilões.
  • Caracterizar o desfecho dos processos.
  • Construir e calcular o índice de valores recuperados.

A pesquisa utilizou como base o conjunto de questões norteadoras abaixo. As questões são guias que orientam a coleta de dados, ou seja, elas não são explicitamente incluídas no questionário de pesquisa, já que algumas delas demandam o cruzamento de várias informações distintas. As perguntas do questionário são os insumos dos cruzamentos que respondem a essas perguntas.

  1. Quais são as origens de um processo de falência?
    • Proporção de casos de convolação e autofalência.
    • Motivos da convolação de recuperação judicial em falência.
  2. Quais são as características das partes envolvidas nos processos?
    • Tipo de atividade, e natureza das empresas.
    • Tipo de atividade dos credores que entram com pedidos de falências.
  3. Como varia o desfecho dos processos?
    • Proporção de falências não decretadas.
    • Fundamentos da decretação de falência.
    • Casos encerrados por falta de pagamento de caução.
  4. Quanto tempo dura um processo de falência?
    • Tempo entre a data do pedido e a data de decretação da falência.
    • Tempo entre decretação e primeira avaliação dos bens.
    • Características do processo que impactam no tempo de duração.
  5. Quais são as características típicas das avaliações e leilões?
    • Valores envolvidos nas avaliações e leilões.
    • Características dos itens aumentam ou reduzem a probabilidade de venda.
    • Razão entre valor avaliado e valor vendido.
  6. Qual é a taxa de recuperação das dívidas?
    • Estratégia para calcular taxa de recuperação.
    • Características dos processos que influenciam na taxa de recuperação.

1.2 Organização do trabalho

O relatório foi organizado em dois capítulos, além desta introdução. No Capítulo 2, apresentamos as decisões metodológicas, procedimento de coleta e organização dos dados. No Capítulo 3, apresentamos os principais resultados da pesquisa, organizados de acordo com as questões norteadoras.


  1. A liquidação extrajudicial é um processo administrativo, geralmente iniciado por agências reguladoras, voltado a alguns tipos de empresas como seguradoras, bancos e planos de saúde. A liquidação busca recuperar as empresas em crise fora de um processo judicial. Caso a liquidação extrajudicial não seja bem sucedida, o processo segue para o judiciário na forma de autofalência.↩︎