Capítulo 6 Deferimento do processamento da recuperação judicial

Da análise dos dados, as varas comuns deferiram 626 recuperações judiciais e indeferiram 210. Nas especializadas, foram deferidas 196 recuperações judiciais e indeferidas 162. Em termos relativos, a taxa total de deferimento, considerando varas comuns e especializadas, foi de 68,8%, enquanto nas especializadas e nas comuns as taxas foram de 74,9% e 54,7%, respectivamente.

O aumento do percentual de deferimentos ocorre diante da presença de vários fatores, sendo os principais a presença de litisconsórcio, o foro no qual tramita a recuperação (especializado contra comum) e o faturamento das requerentes.

Caso não haja litisconsórcio, a média de deferimentos totais da vara especializada e da comum é de 63,0% (582 processos). Se houver litisconsórcio no polo ativo, a taxa de deferimento é de 88,9% (240 processos).

Tabela 6.1: Taxa de deferimento dos processos separados de acordo com a presença de litisconsórcio ativo.
Litisconsórcio Indeferidas Deferidas Taxa de deferimento
Não 342 582 63,0%
Sim 30 240 88,9%

Os referidos percentuais variam em relação às varas especializadas e não especializadas. Para pedidos de recuperação feitos por um grupo de empresas, a taxa de deferimento na comum é de 91,9% e na especializada de 80,8%.

Ainda que nas varas comuns a taxa seja maior, a diferença responsável pela distorção nas taxas globais está nos pedidos feitos por uma única empresa requerente. Enquanto na especializada a taxa de deferimento para requerentes únicas é de 48,1%, na comum ela é de 69,6%. Ou seja, na comum o fato de não ser um litisconsórcio aumenta a chance de deferir o processamento.

Tabela 6.2: Taxas de deferimento e indeferimento separados por local de tramitação (especializada e comum) e presença de litisconsórcio ativo.
Litisconsórcio Especializada Indeferidas Deferidas Taxa de deferimento
Não Não 194 445 69,6%
Não Sim 148 137 48,1%
Sim Não 16 181 91,9%
Sim Sim 14 59 80,8%

Conforme já mencionado, outro fator muito significativo para a possibilidade de deferimento das recuperações é o tamanho das requerentes, nesta pesquisa baseado no faturamento. Conforme ilustram a Figura 6.1 e a Tabela 6.3, os processos em que as requerentes são maiores apresentam uma maior taxa de deferimento, chegando a 88,8% acima de R$ 10 milhões, e de 79,8% entre R$ 1 e R$ 10 milhões.

Tabela 6.3: Taxa de deferimento separada por faixa de faturamento.
Faixa de faturamento Indeferidas Deferidas Taxa de deferimento
Até R$ 1MM 27 74 73,3%
Entre R$ 1MM e R$ 5MM 24 95 79,8%
Entre R$ 5MM e R$ 10MM 14 40 74,1%
Entre R$ 10MM e R$ 50MM 21 165 88,7%
Entre R$ 50MM e R$ 100MM 4 50 92,6%
Acima de R$ 100MM 12 77 86,5%
Sem informação 270 321 54,3%

Essa diferença é constante tanto nas varas especializadas quanto nas comuns. Entretanto, existe um desnível significativo entre as taxas de deferimento das varas especializadas e comuns quando a comparação é feita dentro de cada faixa de faturamento. Nas empresas grandes, não há diferença significativa, mas para empresas com faturamento até R$ 1 milhão ou sem faturamento identificado na documentação disponível, as varas especializadas deferem os processamentos com menor frequência.

Taxa de deferimento separada por faixa de faturamento.

Figura 6.1: Taxa de deferimento separada por faixa de faturamento.

6.1 Emendas à petição inicial

Pelos dados coletados, as varas especializadas determinam maior número de emendas à petição inicial. Do total de processos da especializada, 69,8% sofrem emendas à petição inicial. Na comum, esses números são de apenas 52,3%.

Tabela 6.4: Presença de emenda na petição inicial na especializada e na comum.
Especializada? Nº de emendas requeridas Nº de PIs sem emenda Taxa emenda
Não 437 399 52,3%
Sim 250 108 69,8%

A determinação de emendas depende pouco do faturamento. O destaque é da faixa de faturamento entre R$ 5 e R$ 10 milhões, onde a taxa de emendas sobe para 72,2%.

Tabela 6.5: Taxa de emendas à petição inicial separada por faixa de faturamento.
Faixa de faturamento? Nº de emendas requeridas Nº de PIs sem emenda Taxa emenda
Sem informação 319 272 54,0%
Até R$ 1MM 59 42 58,4%
Entre R$ 1MM e R$ 5MM 76 43 63,9%
Entre R$ 5MM e R$ 10MM 39 15 72,2%
Entre R$ 10MM e R$ 50MM 104 82 55,9%
Entre R$ 50MM e R$ 100MM 32 22 59,3%
Acima de R$ 100MM 58 31 65,2%

Nas varas especializadas, a presença de determinação de emenda está associada a uma maior probabilidade de deferimento da recuperação judicial. Nas varas comuns, a presença de emendas o efeito é contrário.

Essa situação pode ser explicada por uma maior propensão dos magistrados das varas especializadas a indeferir imediatamente petições iniciais de requerentes em situação que não condiz com o deferimento de uma recuperação judicial, o que razoavelmente pode coincidir com documentação fora dos padrões estipulados pelo artigo 51. Seguindo essa lógica, nos processos da vara comum as emendas seriam requeridas independentemente de outros juízos feitos sobre as petições iniciais, o que implicaria indeferimentos que acontecem apenas após todos os requisitos formais encontrarem-se contemplados.

Tabela 6.6: Taxas de deferimento separadas por especialização de justiça e pela presença de emendas à petição inicial.
Tipo de vara Houve emenda? Nº de RJs deferidas Nº de RJs indeferidas Taxa def.
Varas comuns Não 330 69 82,7%
Varas comuns Sim 296 141 67,7%
Varas especializadas Não 55 53 50,9%
Varas especializadas Sim 141 109 56,4%

Nas varas comuns, do total de processos em que não houve emenda à petição inicial, 399 casos, o percentual de deferimento da recuperação judicial foi de 82,7%, o que representa 330 processos. A presença da emenda, por seu turno, faz com que o índice de deferimentos do processamento reduza para 67,7%, num montante de 296 processos de um total de 437.

Nas especializadas, por outro lado, do total de processos em que não houve emenda à petição, 250 casos, o percentual de deferimento da recuperação foi de 56,4%. A presença da emenda faz com que esse índice suba para 56,4%, 141 casos sobre um total de 250 processos.

6.2 Perícia prévia

Nas varas especializadas, a perícia prévia foi realizada em 12,0% dos processos (43 casos), enquanto nas comuns em 9,4% dos processos (79 casos). É de se observar, no entanto, que a utilização da perícia prévia só teve início em 2014 em parte das varas especializadas, então o baixo número do resultado se explica pela amostragem ter grande parte anterior a esta data.

De forma geral, sem perícia prévia, a taxa de deferimento das recuperações judiciais é de 67,3% (721 processos) e 32,7% de indeferimentos (351 processos). Com perícia prévia, a taxa de deferimento dos processos é de 82,8% (101 processos) e de 17,2% de indeferimentos (21 processos).

Nas varas especializadas, a realização de perícia prévia implica taxa de deferimento de 79,1% (34 dos 43 processos em que ela foi feita), enquanto que sem perícia prévia o deferimento foi de apenas 51,4% (162 processos de 315).

Nas varas comuns, a realização de perícia prévia implicou processamento de 84,8% (67 de 79 processos), enquanto a taxa de deferimento sem perícia prévia foi de 73,8% (559 de 757).

Tabela 6.7: Taxa de deferimento separada por presença de perícia prévia e pela localidade de tramitação.
Tipo de vara Houve perícia prévia? Nº de RJs deferidas Nº de RJs indeferidas Taxa def.
Varas comuns Não 559 198 73,8%
Varas comuns Sim 67 12 84,8%
Varas especializadas Não 162 153 51,4%
Varas especializadas Sim 34 9 79,1%

Quanto à perícia prévia, identifica-se maior propensão ao deferimento do processamento nos casos em que o instituto é aplicado e de forma ainda mais eficiente do que a emenda aos processos isoladamente. A presença de perícia aumenta a taxa de deferimento tanto na presença quanto na ausência de emendas à petição inicial. Cabe ressaltar que o aumento é ainda maior nas varas especializadas. Enquanto nas varas comuns as perícias aumentam as taxas de deferimento de processos com e sem emenda de 65,4% e 82,8%, respectivamente, para 87,2% e 81,2%, nas varas especializadas o aumento é de 52,6% e 49,0% para 80,0% e 75,0%. Ou seja, enquanto o aumento pequeno ou inexistente nas comuns, nas especializadas esse aumento é significativo.

Tabela 6.8: Taxa de deferimento separado por localidade, presença de emenda à petição inicial e presença de perícia prévia.
Tipo de vara Houve perícia prévia? Houve emenda? Nº de RJs deferidas Nº de RJs indeferidas Taxa def.
Varas comuns Sem perícia prévia Não 304 63 82,8%
Varas comuns Sem perícia prévia Sim 255 135 65,4%
Varas comuns Com perícia prévia Não 26 6 81,2%
Varas comuns Com perícia prévia Sim 41 6 87,2%
Varas especializadas Sem perícia prévia Não 49 51 49,0%
Varas especializadas Sem perícia prévia Sim 113 102 52,6%
Varas especializadas Com perícia prévia Não 6 2 75,0%
Varas especializadas Com perícia prévia Sim 28 7 80,0%

Em síntese, a perícia prévia é a variável, seguida da presença de litisconsórcio, que mais se associa ao deferimento do processamento, principalmente se comparada à própria emenda à inicial isolada. A título de comparação, enquanto a perícia prévia acompanhada de emenda gera 84,1% de taxa de deferimentos da recuperação judicial, a emenda desacompanhada de perícia prévia gera apenas 60,8% de aprovação.

6.3 Tempo até deferimento

A mediana de tempo total até o deferimento do processamento da recuperação judicial não variou nas varas comuns com as especializadas. Embora as médias sejam muito diversas, as medianas para o deferimento foram de 58 e 54 dias nas comuns e nas especializadas, respectivamente.

Tabela 6.9: Medidas resumo do tempo (em dias) até o deferimento nas varas comuns e nas especializadas.
Vara N Média Mediana Máximo
Comum 818 132,9 58 1794
Especializada 354 79,0 54 879

Em relação ao faturamento das recuperandas, o tempo para a decisão de processamento variou, de modo que as recuperandas com maior faturamento tiveram decisões de processamento mais rápidas.

Tabela 6.10: Medidas resumo do tempo até o deferimento separados por faixa de faturamento.
Faturamento N Média Mediana Máximo
Até R$ 1MM 74 63,2 42,0 388
Entre R$ 1MM e R$ 5MM 95 101,4 63,0 879
Entre R$ 5MM e R$ 10MM 40 86,1 73,0 336
Entre R$ 10MM e R$ 50MM 163 87,4 43,0 1570
Entre R$ 50MM e R$ 100MM 50 46,3 34,0 187
Acima de R$ 100MM 75 52,9 35,0 360
Sem informação 311 74,6 44,0 1183

Essa correlação se manteve se diferenciarmos os processos das varas especializadas com os processos das varas comuns.

Tempo mediano até o deferimento separado por faixa de faturamento e pela localidade.

Figura 6.2: Tempo mediano até o deferimento separado por faixa de faturamento e pela localidade.

O tempo mediano do deferimento da recuperação judicial é alterado se há emenda em todos os tamanhos de recuperanda medidos pelo faturamento.

Tempo mediano até o deferimento separado por faturamento e pela presença de emenda à petição inicial.

Figura 6.3: Tempo mediano até o deferimento separado por faturamento e pela presença de emenda à petição inicial.

Somando os processos das varas comuns e das especializadas, o tempo mediano até a determinação de emendas à petição inicial foi de 20 dias, enquanto a mediana para o mesmo prazo para perícias prévias foi de 33 dias1.

Tabela 6.11: Tempos médios, medianos e máximos até determinação de emendas e perícias.
Evento N Média Mediana Máximo
Emenda 682 38,0 20 770
Perícia 120 82,8 33 758

Nos processos em que não houve nem emenda e nem perícia prévia, o prazo mediano até deferimento foi de 26 dias. Nos processos em que houve perícia prévia, mas não houve emenda, a mediana foi de 28 dias. Nos em que houve emenda, mas não houve perícia prévia, a mediana foi de 60 dias. Nas em que houve emenda e perícia prévia, a decisão de processamento demorou 63 dias.

Tabela 6.12: Tempos médios, medianos e máximos até o deferimento separados por presença e ausência de emendas e perícia prévias.
Emenda Perícia N Média Mediana Máximo
Não Não 345 58,2 26 1570
Não Sim 32 53,7 28 574
Sim Não 362 89,5 60 1183
Sim Sim 69 105,4 63 1012

  1. Em alguns casos, a data coletada foi da realização da emenda ou juntada do laudo pericial, e não a determinação de tais atividades. Por isso, os tempos podem estar superestimados.↩︎